As 10 Megatendências da Inovação Energética: Desafios Regulatórios e Caminhos para a Transição Justa e Segura
Por Marina Meyer Falcão
A transição energética global deixou de ser apenas uma diretriz ambiental para se tornar um imperativo econômico, tecnológico e regulatório. No centro desse movimento estão as megatendências que moldam o futuro do setor energético, conforme destacam os relatórios mais recentes da MIT Technology Review Brasil e de vários especialistas em economia e energia.
Essas tendências revelam não apenas a direção da inovação, mas também os pontos críticos de atuação do Direito Regulatório de Energia, em especial no Brasil. Afinal, a segurança jurídica, a previsibilidade normativa e os mecanismos de incentivo serão determinantes para que essas inovações se consolidem aqui em solo brasileiro .
Os próximos anos serão desafiadores para o setor elétrico brasileiro conforme as dez principais megatendências munidiais ora mapeadas irão mudar a regulação setorial em nosso país.
Dentre as principais destacamos :
1. Captura de Carbono : que é através da tecnologia de captura do CO2, o uso e armazenamento de carbono será vital para mitigar as emissões de indústrias intensivas em carbono. No Brasil, a ausência de um marco legal específico para o mercado de captura de carbono provoca uma insegurança jurídica, especialmente em relação aos seguintes aspectos:
• Regime de licenciamento ambiental
• Titularidade e responsabilidade sobre o carbono armazenado
• Integração ao mercado de carbono nacional (em fase de regulamentação)
2. Outra tendência é a Eficiência Energética com IA e IoT: onde uso de Inteligência Artificial e Internet das Coisas para otimização energética demanda atualização regulatória sobre:
• Proteção de dados (LGPD) no contexto da medição e gestão remota
• Validação de softwares e sensores para fins tarifários
• Responsabilidade em caso de falhas operacionais automatizadas
A ANEEL tem avançado em temas como prédios inteligentes e tarifas horossazonais, mas há espaço para fomentar mais projetos de sandbox regulatórios, por exemplo.
3. Novos Modelos de Negócio em Energia Solar Distribuída: a Lei 14.300/2022 trouxe um marco para a geração distribuída (GD), mas a inovação vai além: plataformas digitais, fintechs e associações consumidoras ganham protagonismo. O desafio é adaptar o arcabouço regulatório à:
• Compartilhamento de créditos e titularidade múltipla;
• Consolidação de associações e consórcios sob estrutura societária segura;
• Tributação em plataformas peer-to-peer;
4. Armazenamento de Energia (BESS): o armazenamento é peça-chave para a confiabilidade do sistema. Ainda assim, falta regulamentação clara para:
• Classificação do BESS (geração, carga ou serviço ancilar?)
• Remuneração por serviços de flexibilidade e resposta à demanda
• Regras de conexão e compensação de perdas
A Consulta Pública nº 30/2023 da ANEEL abriu caminho para o tema, mas o setor aguarda normas definitivas.
5. Combustível Sustentável de Aviação (SAF): o SAF se insere no esforço global de descarbonização do transporte aéreo. A regulação precisa endereçar:
• Certificação do combustível renovável
• Regime fiscal aplicável e incentivos setoriais
• Harmonização com metas de descarbonização internacional (CORSIA, IATA).
A ausência de políticas integradas no Brasil pode comprometer a competitividade do setor aéreo nacional.
6. Hidrogênio Renovável: hidrogênio verde desponta como vetor de exportação e descarbonização industrial. Em termos regulatórios, há desafios como:
• Definição legal de hidrogênio “verde” e “de baixo carbono”
• Licenciamento ambiental e uso da água
• Regulação do transporte, armazenamento e comercialização
O Plano Nacional do Hidrogênio ainda carece de instrumentos jurídicos vinculantes e modelagens comerciais viáveis.
7. Pequenos Reatores Modulares (SMRs): a tecnologia nuclear em pequena escala oferece segurança e escalabilidade, especialmente para regiões isoladas. No entanto:
• A legislação nuclear brasileira ainda é centralizada e restritiva
• O licenciamento pela CNEN (Comissão Nacional de Energia Nuclear) é complexo
• Falta previsão de inserção dos SMRs nos leilões de energia
8. Materiais Avançados: temos como grande avanço o Grafeno, supercondutores e nanomateriais exigem um olhar atento para:
• Propriedade intelectual e patentes tecnológicas
• Certificação técnica e segurança de uso
• Barreiras regulatórias à importação e desenvolvimento local
A regulação precisa dialogar com as agências de ciência e tecnologia, além do INMETRO.
9. Fusão Nuclear: Embora ainda experimental, a fusão representa uma revolução potencial. O Brasil deve preparar sua base legal e institucional para:
• Pesquisa pública e cooperação internacional
• Regulação de riscos e segurança futura
• Participação em tratados multilaterais de desenvolvimento nuclear pacífico
10. Computação Quântica: a computação quântica poderá transformar desde a modelagem energética até a cibersegurança no setor elétrico.
No entanto , o desafio regulatório será:
• Garantir a proteção de dados sensíveis e infraestruturas críticas
• Estimular a adoção segura por concessionárias e agentes do setor
• Prever diretrizes sobre interoperabilidade com sistemas legados.
Essas megatendências não apenas projetam o futuro da energia — elas exigem respostas jurídicas agora.
O Brasil precisa avançar em marcos regulatórios previsíveis, flexíveis e integrados, capazes de equilibrar inovação tecnológica, investimentos privados e justiça socioambiental.
Como especialista em Direito Regulatório, entendo que o papel do jurista hoje é ser ponte entre a inovação e a segurança jurídica.
A transição energética é também uma transição normativa — e estamos todos convocados a construí-la com responsabilidade, visão e coragem.
Marina Meyer Falcão – Professora Pós Graduação na PUC/MG. Presidente da Comissão de Energia da OAB de Minas Gerais Diretora Jurídica e Secretária de Assuntos Regulatórios do INEL, Socia da Area de Energia no Manucci Advogados. Advogada especialista em Direito de Energia.