Enio Fonseca e Decio Michellis Jr.
“Ah, eu devo a vida ao mundo…
Vocês, formigas, estavam certas quando disseram
que tinham que trabalhar para conseguir tudo o que queriam.”
(Shirley Temple, “O mundo me deve a vida”)
A Cigarra e a Formiga é uma das fábulas atribuídas ao escritor grego Esopo (620 a.C.–564 a.C.) e recontada pelo poeta e fabulista francês Jean de La Fontaine (1621–1695).
Na imagem ao lado “A cigarra e a formiga” na ilustração de Gustave Doré da década de 1880, que retrata a história como uma situação humana. Uma musicista está em pé em uma porta na neve com as crianças da casa olhando para ela com simpatia. A mãe delas olha para baixo do topo da escada. Os leitores de sua época estavam cientes do dever cristão da caridade e, portanto, sentiam a ambiguidade moral da fábula.
A fábula foi transposta para o cinema num curta-metragem da Disney, The Ant and the Grasshopper (1934). Ele confronta o dilema de como lidar com a imprevidência do ponto de vista do New Deal de Franklin D. Roosevelt. Parte da série Silly Symphonies, a animação contava com a canção The world owes me a living, composta por Leigh Harline e Larry Morey e imortalizada por Shirley Temple () com versos reproduzidos acima.
Ao longo dos séculos a fábula sofreu releituras por vários escritores, humoristas, publicitários, teatrólogos e outros artistas, entre eles os brasileiros Monteiro Lobato, Millôr Fernandes e Jô Soares.
A fábula e contrafábula tem sido usado por diferentes vieses morais, ideológicos e políticos sobre o comportamento providente e imprevidente, as virtudes do trabalho duro e os perigos da imprevidência, caridade, avareza, egoísmo etc. como tipificado pelos insetos. Nas Fábulas de La Fontaine, nenhum julgamento final é feito. Mas o ponto de vista na maioria das releituras da fábula é favorável à formiga.
Imprevidência
A imprevidência se refere a acontecimentos que poderiam ser evitados, se alguma prevenção tivesse sido adotada. Havendo imprevidência, ou seja, descuido, desleixo, negligência, desídia, omissão, falta de prevenção contra tragédias acarretadas por fenômenos naturais nos serviços energéticos (todas as atividades voltadas para o sistema energético: produção, transporte, distribuição e comercialização de algum tipo de energia), a alegação de força maior é desconsiderada.
Está diretamente associada a falta de organização típica de logística de mobilização ou carências logísticas: recursos humanos; financeiros; equipamentos; veículos; material de reposição; suprimento; manutenção; engenharia; transporte; e salvamento.
O teste de estresse financeiro é uma avaliação que simula cenários adversos para verificar a capacidade de uma instituição financeira de suportar perdas e continuar a prestar serviços. Ele simula situações extremas, como crises econômicas, altas taxas de juros, quedas de mercado, inadimplência, falta de liquidez, entre outras.
Por verossimilhança pode ser aplicado exercícios de simulação de mobilização (a mobilização é uma atividade que se inicia após a determinação dos recursos que não podem ser supridos pela logística). teste de stress das contingências no fornecimento de energia elétrica deve:
- Considerar a duração; amplitude geográfica; volume e complexidade das ocorrências;
- Identificar as necessidades dos órgãos operacionais;
- Conhecer as fontes alternativas de fornecimento de recursos;
- Atribuir prioridades às ações contingentes, interinas e adaptativas;
- Previsão e provisão dos recursos e dos serviços necessários;
- Antecipar o estabelecimento de prioridades para o atendimento às necessidades decorrentes da iminência de concretização;
- Orçamento para atendimento e limitações orçamentárias;
- Capacitação do pessoal;
- Planejamento da complementação das necessidades nos sistemas elétricos, planos e programas e existentes;
- A orientação do planejamento inicia-se no mais alto nível do processo decisório, desencadeando as demais orientações decorrentes;
- Revisões periódicas dos parâmetros de planejamento;
- Retorno gradual à normalidade (desmobilização).
O Apagão Ibérico de 2025
O apagão europeu de 2025 foi um apagão geral que teve início às 11h33 (hora de Lisboa) / 10h33 UTC (Coordinated Universal Time) em 28/04/25, afetando toda a Península Ibérica, Portugal continental e a Espanha peninsular, Andorra e o sudoeste de França. A energia elétrica foi interrompida por cerca de 12 a 14 horas na maior parte da Península e mais tempo em algumas áreas.
Condições da rede em Espanha antes do apagão: 32 GW sendo Energia solar fotovoltaica (FV) (59%), Eólica (12%), Nuclear (11%), Outros (13%) e Gás natural (5%). Eólica e solar eram 71 % do fornecimento.
De acordo com o site da operadora elétrica espanhola Red Eléctrica de España (REE), havia energia suficiente fornecida à rede antes da interrupção. De acordo com o site, às 12h30 do dia 28 de abril, a rede era abastecida com 32 gigawatts (GW) de energia para atender a 25 GW de demanda e estava exportando 7 GW. Mais da metade do fornecimento de energia era solar. ()
Consequências do apagão:
- Oito vítimas fatais confirmadas decorrentes do apagão.
- Perdas econômicas estimadas em até € 5 bilhões.
- Colapso total e completo para 60 milhões de pessoas.
Para mais detalhes leia os artigos já publicados de nossa autoria sobre o tema:
“Apagão Europeu: o princípio do fim?”, disponível em: https://synergiaeditora.com.br/apagao-europeu-o-principio-do-fim/
“Extremos Climáticos e a Geração de Energia Renovável”, disponível em: https://direitoambiental.com/extremos-climaticos-e-a-geracao-de-energia-renovavel/
“Curtailment: “Psicose” à Brasileira”, disponível em: https://direitoambiental.com/curtailment-psicose-a-brasileira/
“Inércia: devagar quase parando”, disponível em: https://direitoambiental.com/inercia-devagar-quase-parando/
O crescimento das energias renováveis está ultrapassando as soluções de armazenamento: À medida que a Espanha aprofunda sua transição para energia limpa, o crescente domínio da energia solar, eólica e outras fontes renováveis está criando novas pressões operacionais sobre a rede. Maiores oscilações na oferta e na demanda são uma provável pressão da energia solar e eólica. Já em 2024, a Espanha começou a apresentar horas de preços negativas, superando as do Reino Unido, o que é um sinal comum de que mais energia renovável está sendo produzida e excedendo a demanda, e que as capacidades atuais de armazenamento são insuficientes. Em 2025, a Espanha tinha apenas 60 MW de capacidade de sistema de armazenamento de energia em bateria (BESS), sua meta geral de armazenamento de energia para 22,5 GW até 2030, de acordo com seu Plano Nacional de Energia e Clima (PNEC). No momento do blecaute os preços eram negativos. As novas fontes de eletricidade estão sujeitas a variações incontroláveis no fornecimento, que não podem ser facilmente sincronizadas com a demanda, com uma suscetibilidade desastrosa a causar o desligamento de redes inteiras.
Sistema de Armazenamento de Energia de Bateria (BESS)
Um sistema de armazenamento de energia de bateria (BESS) é um sistema que usa baterias para armazenar energia elétrica para uso posterior. Ele pode capturar energia de diversas fontes, incluindo fontes renováveis como solar e eólica, e armazená-la em baterias recarregáveis. Podem ser conectados à rede elétrica, permitindo tanto o carregamento quanto o descarregamento de energia. Quando a energia é necessária, as baterias descarregam para fornecer energia, ajudando a equilibrar a oferta e a demanda de energia, bem como contribuindo para estabilizar a rede elétrica. São geralmente projetados para fornecer sua potência nominal total por durações que variam de 1 a 4 horas.
Principais componentes e funcionalidades:
- Baterias: O núcleo de um BESS, normalmente usa baterias de íon de lítio. Uma bateria de fluxo de vanádio de 4 horas a 175 MW / 700 MWh foi inaugurada em 2024. () Baterias de chumbo-ácido ainda são usadas em aplicações de pequeno orçamento. Baterias à base de sódio estão sendo cada vez mais consideradas para aplicações BESS. Em comparação com baterias de lítio, baterias de sódio têm um custo um pouco menor, melhores características de segurança e características de entrega de energia semelhantes.https://www.bestmag.co.uk/wp-content/uploads/2024/12/rongke-700MWh-Project.png
- Inversores: Convertem a eletricidade de corrente contínua (CC) das baterias em corrente alternada (CA) para uso na rede.
- Sistemas de controle: gerenciam o carregamento e o descarregamento das baterias, otimizando seu desempenho e integrando-se com outras fontes de energia.
Funcionalidades:
- Os BESSs ajudam a suavizar a natureza intermitente das fontes de energia renováveis, armazenando o excesso de energia quando a produção é alta e liberando-a quando necessário.
- Os BESSs também podem fornecer serviços de resposta rápida, como regulação de frequência e controle de tensão, melhorando a estabilidade e a confiabilidade da rede. Pode fazer a transição do modo de espera para a potência máxima em menos de um segundo (10 ms) para lidar com contingências da rede.
- Os BESSs podem armazenar energia fora dos horários de pico e descarregá-la durante os horários de pico (quando a tarifa pode custar até 11,2 vezes ou 1.120 % comparando os valores da tarifa fora de ponta x tarifa de ultrapassagem na ponta), reduzindo os custos de energia e a demanda na rede.
- Os BESSs podem permitir a operação de microrredes e comunidades isoladas de energia, fornecendo armazenamento e gerenciamento de energia localizados.
- Em situação de blecaute podem fornecer energia de reserva para cargas críticas.
As baterias sofrem de envelhecimento do ciclo ou deterioração causada por ciclos de carga-descarga. Essa deterioração é geralmente maior em altas taxas de carga e maior profundidade de descarga. Esse envelhecimento causa perda de desempenho (diminuição de capacidade ou tensão), superaquecimento e pode eventualmente levar a falha crítica (vazamentos de eletrólitos, incêndio, explosão).
A infraestrutura tem uma vida útil de 10 a 20 anos, após o que deve ser completamente removida e substituída.
Apesar do foco até o momento do armazenamento de energia em baterias ter sido direcionado mais às fontes solar e eólica, o BESS também possui aplicações relevantes para as fontes hídricas, em especial para as Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) e Centrais de Geração Hídrica (CGHs).
Um exemplo dessa integração é a usina hidrelétrica de Vogelgrun, no Rio Reno, na França, que está implementando BESS para aumentar a flexibilidade operacional e minimizar o desgaste dos equipamentos.
Com capacidade de 142 MW e quatro turbinas Kaplan de baixa queda, uma das turbinas foi hibridizada com o BESS como parte da iniciativa XFLEX HYDRO, financiada pela União Europeia. Vogelgrun é uma das duas usinas hidrelétricas da EDF envolvidas neste projeto. ()
O Brasil carece de um marco regulatório específico para Sistema de Armazenamento de Energia de Bateria. Também faltam sinais econômicos para remunerar os serviços ancilares prestados por essa tecnologia — como regulação de frequência e estabilidade de tensão entre outros.
O custo inicial é o maior obstáculo à expansão dos Sistemas de Armazenamento de Energia de Bateria:
Só para comparação a tarifa média no Brasil é de R$ 740,00/MWh (US$ 133,64/MWh) ()
Do Plano Decenal 2034 temos: “as baterias ainda estão longe de ser atrativas economicamente.
Portanto, no atual momento, a perspectiva para o horizonte decenal é que sua entrada seja ainda marginal, presente em alguns projetos específicos, que estejam considerando outros aspectos (sociais, ambientais etc.), além do econômico na decisão de investimento. Por exemplo, a substituição da geração diesel pode se dar pela redução do ruído, assim como a opção pelas baterias residenciais pode ser movida por um desejo de fonte de backup contra blackouts, independentemente do custo de atendimento.” ()
“O Brasil está próximo de atingir 1 GWh de capacidade instalada em sistemas de armazenamento de energia com baterias (BESS, na sigla em inglês) em 2025, solução considerada crucial para dar mais segurança de fornecimento a fontes renováveis como eólica e solar. Desse total, 70% está concentrado em sistemas isolados, não conectados à rede elétrica básica.
Atualmente, a capacidade instalada de BESS no Brasil é de 685 MWh (junho de 2025). Apenas 10% desse total são usados em projetos de geração centralizada, e 7,5% em aplicações comerciais e industriais, detalhou o Megawhat, em matéria reproduzida pela Folha. Em 2024, foram adicionados 269 MWh ao sistema nacional, um aumento de 29% em relação ao ano anterior.” ()
Destinação final de baterias
No Brasil, a Lei nº 12.305/2010 estabelece a Política Nacional de Resíduos Sólidos, que inclui diretrizes para a gestão de resíduos de baterias. Além disso, alguns fabricantes , empresas, instituições de ensino e de desenvolvimento de tecnologia e processos estão desenvolvendo programas de reciclagem e reutilização de baterias. Alguns estados e municípios têm regulamentações específicas para a gestão de resíduos de baterias.
A destinação final das baterias de armazenamento de energia eólica e solar e outras fontes, é um desafio complexo para se garantir a sustentabilidade dessas tecnologias.
As baterias para armazenar energia solar ou eólica podem conter vários materiais, incluindo metais pesados, dependendo do tipo de bateria. Aqui estão alguns exemplos:
- Baterias de Íon de Lítio (Li-ion): são amplamente utilizadas para armazenamento de energia renovável e contêm lítio, níquel, cobalto, grafite e outros materiais. Embora não contenham metais pesados como chumbo ou mercúrio, a extração de lítio e cobalto pode ter impactos ambientais e sociais.
- Baterias de Chumbo-Ácido: são utilizadas em algumas aplicações de armazenamento de energia e contêm chumbo, um metal pesado tóxico. A reciclagem dessas baterias é importante para evitar a contaminação do solo e da água.
- Baterias de Níquel-Cádmio (Ni-Cd): embora menos comuns, essas baterias contêm cádmio, um metal pesado tóxico. A reciclagem dessas baterias é importante para evitar a contaminação do solo e da água.
Os metais pesados presentes em algumas baterias podem ter impactos ambientais e de saúde se não forem manuseados e descartados corretamente.
A destinação final das baterias armazenadoras de energia solar é uma responsabilidade compartilhada entre vários atores. Aqui estão algumas perspectivas:
- Fabricantes: os fabricantes de baterias têm uma responsabilidade importante na destinação final das baterias, pois são os principais responsáveis pela concepção e produção das mesmas. Eles podem:
- Desenvolver programas de reciclagem e reutilização de baterias.
- Fornecer informações sobre a destinação final das baterias aos consumidores.
- Implementar práticas de design sustentável para facilitar a reciclagem e reutilização.
- Empreendedores e consumidores: os empreendedores e consumidores que utilizam as baterias armazenadoras de energia solar também têm uma responsabilidade importante na destinação final das mesmas. Eles podem:
- Participar de programas de reciclagem e reutilização de baterias.
- Escolher fabricantes que ofereçam opções de reciclagem e reutilização.
- Armazenar e descartar as baterias de forma segura e responsável.
- Governos e regulamentadores: os governos e regulamentadores têm um papel importante na definição de políticas e regulamentações para a destinação final das baterias armazenadoras de energia solar. Eles podem:
- Estabelecer normas e regulamentações para a reciclagem e reutilização de baterias.
- Fornecer incentivos para a adoção de práticas sustentáveis.
- Monitorar e fiscalizar a destinação final das baterias.
A aplicação da economia circular às baterias armazenadoras de energia solar pode trazer ainda vários benefícios, como: - Redução do desperdício: a reciclagem e reutilização de baterias podem ajudar a reduzir o desperdício e minimizar o impacto ambiental da produção de novas baterias.
- Design sustentável: os fabricantes de baterias podem adotar práticas de design sustentável, como projetar baterias para serem mais fáceis de reciclar ou reutilizar.
- Cadeia de suprimentos circular: a cadeia de suprimentos de baterias pode ser projetada para ser circular, com materiais sendo constantemente cíclicos entre a produção, uso e reciclagem.
- Reciclagem: A reciclagem de baterias é uma opção promissora para recuperar materiais valiosos, como lítio, níquel, cobalto e grafite. A reciclagem pode ajudar a reduzir a demanda por matérias-primas virgens e minimizar o impacto ambiental da mineração.
- Reutilização: As baterias que não são mais adequadas para armazenamento de energia em larga escala podem ser reutilizadas em aplicações menores, como armazenamento de energia em residências ou veículos elétricos.
- Desmontagem e reutilização de componentes: As baterias podem ser desmontadas e seus componentes reutilizados em outras aplicações, como a fabricação de novas baterias ou outros produtos.
- Disposição em aterros sanitários: Embora não seja a opção mais sustentável, as baterias podem ser dispostas em aterros sanitários especializados, desde que sejam projetados para lidar com os materiais perigosos presentes nas baterias.
- Programas de coleta e reciclagem: Alguns fabricantes e governos estão implementando programas de coleta e reciclagem de baterias, que podem ajudar a garantir que as baterias sejam destinadas de forma responsável ao fim da vida útil.
- Conservação de recursos: a reciclagem de baterias pode ajudar a conservar recursos A vida útil de grandes baterias para armazenar energia eólica e solar varia de acordo com a tecnologia utilizada.
- Aqui estão algumas opções:
- Baterias de Íon-Lítio: têm uma vida útil prolongada, geralmente entre 5 a 15 anos, dependendo do uso e manutenção. São amplamente utilizadas em dispositivos eletrônicos e veículos elétricos devido à sua alta densidade de energia e eficiência.
- Baterias de Ácido-Chumbo: têm uma vida útil mais curta, geralmente entre 3 a 7 anos, e requerem mais manutenção. São mais acessíveis inicialmente, mas podem ter custos mais altos a longo prazo.
- Baterias de Fluxo: podem ter uma vida útil mais longa, pois permitem armazenamento escalável e são ideais para aplicações de grande porte. No entanto, podem requerer mais espaço para instalação.
- Baterias Gravitacionais: podem ter uma vida útil mais longa do que as baterias tradicionais, pois não envolvem reações químicas e podem armazenar energia por longos períodos. São uma opção promissora para armazenamento de energia em larga escala.
A capacidade de reciclagem de baterias de acumulação de energia eólica ou solar no Brasil ainda não está bem estabelecida devido à falta de infraestrutura e normas específicas para lidar com este tipo de resíduo.
Nova lei do Texas obrigará energias renováveis a serem despacháveis
“Em 2021, a tempestade de inverno Uri levou a rede elétrica do Texas ao limite, a apenas 4 minutos e 37 segundos do colapso total. Neve, gelo e temperaturas congelantes cobriram todos os 254 condados do estado por cinco dias, a partir de 13 de fevereiro. Turbinas eólicas congelaram, céus nublados desativaram painéis solares, alguns poços de gás natural sofreram congelamento e até mesmo usinas a carvão tiveram dificuldades com equipamentos congelados.
Com a falha dos geradores e a disparada da demanda por eletricidade, o Conselho de Confiabilidade Elétrica do Texas (ERCOT) ordenou apagões em todo o Texas. Algumas concessionárias locais, sem saber, cortaram o fornecimento de energia para áreas com compressores elétricos de gás natural, o que interrompeu o fluxo de gás para as usinas geradoras, causando mais interrupções. (A Comissão Ferroviária do Texas criou uma nova divisão, Infraestrutura Crítica, para que esse problema nunca mais se repetisse.) A frequência da rede caiu perigosamente abaixo de 60 hertz, quase causando um colapso, mas uma ligeira queda na demanda e a recuperação de parte da geração salvaram a rede do colapso total, o que poderia ter levado semanas para se recuperar de um início “apagado” da rede.
Desde então, a ERCOT, a Comissão de Serviços Públicos do Texas (PUCT) e os legisladores têm se comprometido repetidamente a evitar outro quase desastre. Eles propuseram ideias como:
- Requisitos de climatização para usinas de energia para lidar com frio extremo (aprovado em 2021 pelo Projeto de Lei do Senado 3).
- Incentivos para a construção de mais energia distribuível, especialmente usinas de gás natural, como o Texas Energy Fund (Projeto de Lei 1500, 2023).
- As reformas de mercado priorizam energia confiável, como o Mecanismo de Crédito de
- Desempenho, que foi debatido, mas não implementado.
- Nenhuma dessas propostas abordou diretamente o problema da confiabilidade da rede até que o Projeto de Lei 3356 da Câmara do Texas e o Projeto de Lei 715 do Senado foram recentemente aprovados por comissões legislativas e puderam se tornar lei. Esses projetos estabelecem novas regras de confiabilidade para todos os geradores de energia da ERCOT, não apenas para os novos.
Eles exigem que todos os geradores de energia da ERCOT, incluindo eólicas e solares, sejam despacháveis, o que significa que podem se ajustar rapidamente para atender à demanda.
Para cumprir, os geradores devem construir sua própria energia de reserva, como sistemas de armazenamento de energia de bateria (BESS), ou contratar terceiros para fornecer sua energia de reserva.” ()
Veja detalhes no Anexo I – Proposta de legislação do Texas (HB 3356) sobre requisitos mínimos de confiabilidade para a geração renovável.
Sérvia promove instalações de armazenamento de energia
A capacidade total de usinas eólicas e solares na Sérvia é de 550 MW.
A pedido das operadoras de sistemas de transmissão e distribuição do país, os investidores poderão evitar atrasos na conexão à rede elétrica adicionando baterias com potência operacional equivalente a, no mínimo, 20% de sua usina de energia renovável e capacidade de pelo menos 0,4 MWh para cada megawatt da usina instalada.
Quanto às usinas de energia verde na rede de distribuição, pelas quais a estatal Elektrodistribucija Srbije é responsável, a regra se aplica a unidades entre 400 kW e 5 MW. ()
Instalação de baterias obrigatórias para prosumers na Romênia
O número de prosumers (quem gera sua própria eletricidade, geralmente através de fontes renováveis como painéis solares, e pode até mesmo injetar o excedente na rede, atuando como um pequeno produtor) – famílias, empresas e instituições – chegou a quase 130.000, com capacidade combinada das instalações de 1,7 GW.
A obrigatoriedade de instalação de baterias é para novos proprietários de centrais elétricas para autoconsumo com capacidade entre 10,8 kW e 400 kW.
Os prosumers existentes com instalações entre 3 kW e 400 kW terão que fazer o mesmo até 31 de dezembro de 2027. Se não instalarem armazenamento, sua possibilidade de fornecer eletricidade à rede será limitada a 3 kW.
O sistema de baterias deve corresponder a pelo menos 30% da capacidade das instalações entre 3 kW e 200 kW e a pelo menos 50% das instalações entre 200 kW e 400 kW. ()
Grécia exige telemetria em pequenas unidades fotovoltaicas
Atualmente, a Grécia produz muito mais eletricidade do que necessita em determinados dias, devido à alta penetração de energias renováveis e ao armazenamento insuficiente de energia. As interconexões do país operam perto de seus limites máximos de segurança. Se uma única linha ficar inoperante, isso levaria a um efeito dominó e à possível perda de todas as conexões com os países vizinhos. Como resultado, a frequência pode subir além dos limites de segurança no sistema grego, provocando a dessincronização das usinas e um apagão.
As autoridades gregas impuseram nos últimos meses a adição de sistemas de telemetria a unidades fotovoltaicas com mais de 400 kW conectadas à rede de distribuição para que a Operadora Helênica de Rede de Distribuição de Eletricidade (HEDNO ou DEDDIE) pudesse reduzir sua produção quando necessário. Atualmente, HEDNO pode cortar 1,9 GW de capacidade de energia solar, mas outros 6 GW são ininterruptos.
A HEDNO estima que 5.700 usinas com capacidades de 400 kW a 1 MW devem ser adicionadas aos cortes, bem como 600 usinas com mais de 1 MW cada. ()
Todas as iniciativas acima relacionadas mostram que vários países do mundo estão adotando procedimentos e regras para disciplinar e criar mecanismos de obrigação para os agentes ligados ao setor elétrico implantem mecanismos para a armazenamento de energia através de baterias.
Sugestões a serem avaliadas para aplicação no Brasil
Considerando a experiência internacional sobre os Sistemas de Armazenamento de Energia de Bateria (BESS), o Brasil deveria considerar:
- Os geradores fotovoltaicos e eólicos devem construir sua própria energia de reserva. O sistema deve corresponder a pelo menos 50% das instalações com capacidade de pelo menos 0,4 MWh por cada megawatt instalado, como sistemas de armazenamento de energia de bateria (BESS), ou contratar terceiros para fornecer sua energia de reserva. Obrigatório nas novas e aplicáveis as existentes após amortização (7 anos da entrada em operação). Sem desconto do pagamento de CO2/t equivalente.
- Para prosumers com instalações acima de 200 kW obrigação de instalação adicional de 20 % da potência instalada em sistemas de armazenamento de baterias com capacidade de pelo menos 0,4 MWh por cada megawatt instalado ou contratar terceiros para fornecer sua energia de reserva (faça ou pague, omissões e negligência punidas com multas). Obrigatório nas novas e aplicáveis as existentes após amortização (10 anos da entrada em operação). A inadimplência de obrigações implicará na suspensão do mecanismo de compensação até a regularização, além das multas aplicáveis. Sem desconto do pagamento de CO2/t equivalente.
- Tarifa Horosazonal para prosumers: a exportação de excedentes para a rede será remunerada a razão do preço de ponta ou fora de ponta conforme entregue ao sistema (EP = 2 x EFP) e retornado ao consumidor. Se entregou fora da ponta e consumiu na ponta a proporcionalidade é vinculada aos custos efetivos no momento do consumo.
- Criação do fundo de reserva nos moldes da energia nuclear para eólicas e solares para descomissionamento e desastres ambientais a serem aplicados na reciclagem e reuso, tokenizável para acompanhamento do ciclo de vida dos equipamentos e correta destinação dos resíduos. A Croácia cobra uma taxa de resíduos de painéis solares de € 300 euros por tonelada. A taxa é cobrada sobre o peso total e não sobre os materiais não recicláveis (faça ou pague, omissões e negligência punidas com multas).
- Todas as fontes de geração de energia elétrica passíveis de licenciamento ambiental devem incluir nos EIAs/RIMAs as externalidades negativas (efeitos colaterais negativos que uma atividade de produção ou consumo causa em terceiros) com o mesmo rigor aplicáveis aos grandes empreendimentos hidrelétricos. Nos EIAs/RIMAs além da apresentação de alternativas locacionais devem ser apresentados ACV – Avaliação do Ciclo de Vida que determinou a escolha do tipo de geração e tecnologia selecionada.
- Considerar os efeitos sinérgicos e cumulativos de empreendimentos similares e contíguos para fins de correto enquadramento do licenciamento ambiental observando os impactos não apenas localmente de empreendimentos pontuais..
Conclusões
A economia e a segurança energética nacional dependem de uma rede elétrica estável, confiável e resiliente, alimentada por recursos preferencialmente nacionais. Ao adotar a transição energética é necessário compreender plenamente suas consequências técnicas econômicas, ambientais e geopolíticas.
As energias renováveis supostamente limpas, verdes e ilimitadas são promissoras para um futuro sustentável exigem um plano estratégico de armazenamento de energia para poderem enfrentar os graves desafios técnicos, econômicos e de segurança. Além do armazenamento de energia, pode exigir reforço ou ampliação dos sistemas de transmissão, fornecimento de serviços ancilares e geração de backup para completar a intermitência das fontes dependentes do clima.
Com a eletrificação, a substituição de combustíveis fósseis pela eletricidade, a inteligência artificial começando a exigir enorme poder computacional — a demanda por energia está prestes a disparar.
O apagão ibérico mostra a realidade de que a energia verde e a energia 100% renovável ainda estão sujeitas às leis da física.
O desenvolvimento energético responsável e a gestão socioambiental não são objetivos mutuamente excludentes. Uma estratégia energética equilibrada que incorpore segurança energética, sustentabilidade econômica e responsabilidade ambiental é imprescindível. Sistemas de Armazenamento de Energia de Bateria (BESS) já!
Enio Fonseca – Engenheiro Florestal, Senior Advisor em questões socioambientais, Especialização em Proteção Florestal pelo NARTC e CONAF-Chile, em Engenharia Ambiental pelo IETEC-MG, em Liderança em Gestão pela FDC, em Educação Ambiental pela UNB, MBA em Gestão de Florestas pelo IBAPE, em Gestão Empresarial pela FGV, Conselheiro do Fórum de Meio Ambiente do Setor Elétrico, FMASE, foi Superintendente do IBAMA em MG, Superintendente de Gestão Ambiental do Grupo Cemig, Chefe do Departamento de Fiscalização e Controle Florestal do IEF, Conselheiro no Conselho de Política Ambiental do Estado de MG, Ex Presidente FMASE, founder da PACK OF WOLVES Assessoria Ambiental, foi Gestor Sustentabilidade Associação Mineradores de Ferro do Brasil e atual Diretor Meio Ambiente e Relações Institucionais da SAM Metais. Membro do Ibrades, Abdem, Adimin, Alagro, Sucesu, CEMA e CEP&G/ FIEMG e articulista do Canal direitoambiental.com.
Decio Michellis Jr. – Licenciado em Eletrotécnica, com MBA em Gestão Estratégica Socioambiental em Infraestrutura, extensão em Gestão de Recursos de Defesa e extensão em Direito da Energia Elétrica, é Coordenador do Comitê de Inovação e Competitividade da Associação Brasileira de Companhias de Energia Elétrica – ABCE, assessor técnico do Fórum do Meio Ambiente do Setor Elétrico – FMASE e especialista na gestão de riscos em projetos de financiamento na modalidade Project Finance.
https://independent.academia.edu/DecioMichellisJunior
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