quinta-feira , 11 dezembro 2025
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Espécies Invasoras: Apocalipse Zumbi Invisível?

Enio Fonseca e Decio Michellis Jr.

“O apocalipse biótico é simbólico, histórico, futurista ou preterista? O mundo depende de você, salve-o.”

Um apocalipse zumbi é um cenário de ficção científica e terror onde uma infestação catastrófica de zumbis, geralmente causada por um patógeno (vírus ou fungo), com propagação rápida e exponencial, leva ao colapso da sociedade, transformando vítimas em mortos-vivos que atacam os vivos, exigindo que pequenos grupos de sobreviventes lutem para resistir em um mundo hostil. O desafio é a luta pela sobrevivência contra essa fictícia ameaça crescente, com colapso de governos, infraestrutura, pânico em massa, escassez de recursos e busca por refúgios seguros.
Como as espécies invasoras podem contribuir para isto? 

Espécies Invasoras

Uma espécie é considerada invasora quando é introduzida (geralmente por ação humana, intencional ou acidental) fora de sua área de distribuição natural e sua proliferação causa impactos negativos à biodiversidade nativa, economia ou saúde. Portanto, a definição de “invasora” depende do deslocamento da espécie para um novo ecossistema. Critérios específicos:

  • Exótica (Não Nativa): A espécie é introduzida, intencional ou acidentalmente, fora de sua área de distribuição natural.
  • Capacidade de Estabelecimento e Dispersão: A espécie consegue se adaptar, sobreviver, reproduzir e espalhar-se no novo ambiente.

Impacto Negativo: A presença da espécie causa danos significativos à biodiversidade local, aos ecossistemas, à saúde humana ou à economia.

Uma iniciativa do Ministério do Meio Ambiente (MMA) através da Comissão Nacional de Biodiversidade (Conabio) apresentada à sociedade em 2025, buscava atualizar a Lista Nacional de Espécies Exóticas Invasoras que abranger um conjunto amplo de aproximadamente 444 espécies, incluindo animais e plantas já estabelecidos no Brasil.

A lista reúne 60 espécies de peixes, 36 de invertebrados, 19 de mamíferos e cinco de aves. O documento reúne animais que foram trazidos de outros biomas de fora ou mesmo de dentro do Brasil e se espalharam por vários territórios. Muitas das espécies de fauna e flora que se pretendia incluir na lista tem larga utilização econômica especialmente no agronegócio:
Exemplos de flora: amendoeira-da-praia, capim-colonião, casuarina, eucalipto, goiabeira, jaqueira, mangueira e pinus.
Exemplos de fauna: abelha africana, cães e gatos domésticos, camarão vannamei, camundongo, javali, pardal, pirarucu (introduzidos), pombo-comum, tilápia, truta e tucunaré (introduzidos).
Espécies como o javali, não devem ser tratadas como merecedoras das mesmas políticas públicas de controle, que a tilápia.
Também espécies de uso consagrado na silvicultura como o eucalipto e pinus, não podem correr o risco de serem objeto de estratégicas de erradicação.
O principal estudo sobre espécies exóticas invasoras no Brasil em 2024 foi o Relatório Temático sobre Espécies Exóticas Invasoras, Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos, produzido pela Plataforma Brasileira de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (BPBES). Este relatório, lançado em fevereiro de 2024, mapeou as 476 espécies invasoras (268 animais e 208 plantas/algas) no território brasileiro e destacou seus impactos.
O próprio governo possui estruturas que fomentam e apoiam as atividades econômicas associadas a estas espécies, e elas movimentam bilhões de reais para o País, gerando também um grande contingente de trabalhadores.
A reação da sociedade foi forte o suficiente para fazer com que o Ministério do Meio Ambiente suspendesse temporariamente a publicação da portaria, para promover novos estudos científicos e ouvir de forma adequada a sociedade interessada.
O Brasil é signatário do Acordo Global de Biodiversidade Kunming-Montreal (2015) e tem como meta reduzir até 2030, em pelo menos 50%, as taxas de introdução e o estabelecimento de espécies exóticas invasoras conhecidas ou potenciais, e erradicar ou controlar espécies exóticas invasoras, eliminando, minimizando, reduzindo ou mitigando as vias de introdução e seus impactos sobre a biodiversidade e serviços ecossistêmicos, especialmente em áreas sensíveis ou prioritárias, como ilhas, territórios tradicionais e ancestrais, comunidades isoladas e áreas protegidas, mediante a implementação e monitoramento da Estratégia e do Plano de Ação Nacional para Espécies Exóticas Invasoras e da Lista de Pragas Quarentenárias Presentes e Ausentes.

Reflexões Heterodoxas Sobre as Espécies Invasoras

I – Visão da História Geológica da Terra
Mapa mostra onde sua casa estaria na Terra há 750 milhões de anos: Se você é daquelas pessoas que, na época da escola, perdia a noção do tempo enquanto analisava cada cantinho do planeta nas páginas do geoatlas (e, ainda hoje, faz o mesmo no Google Maps), então você precisa conhecer o Ancient Earth. A ferramenta permite algo que, de tão incrível, chega a ser inacreditável: marcar um endereço específico no globo terrestre (digamos, a sua casa) e acompanhar como o local foi evoluindo ao longo de centenas de milhões de anos na escala de tempo geológica até chegar aos dias atuais.
http://dinosaurpictures.org/ancient-earth#240
Em uma rápida e simples busca, é possível descobrir que o estado de São Paulo foi, durante muito tempo, vizinho de Angola no supercontinente Pangeia. Até que, por volta de uns 150 milhões de anos atrás, no final do Período Jurássico, quando os dinossauros reinavam absolutos sobre a Terra, as duas massas de terra racharam e começaram a se separar. Bem antes disso, há 300 milhões de anos, no ocaso do Carbonífero, as terras paulistas estavam totalmente congeladas sob calotas polares.
O vídeo no link abaixo reconstrói o movimento das placas tectônicas do planeta nos últimos 1,8 bilhão de anos:

Entre os planetas do Sistema Solar, a Terra é única por ter placas tectônicas. Sua superfície rochosa é dividida em fragmentos (placas) que se chocam uns com os outros e criam montanhas, ou se separam e formam abismos que são preenchidos por oceanos.
A primeira evidência de células complexas com núcleos – como todas as células animais e vegetais – data de 1,65 bilhão de anos atrás.
A Terra está a caminho de um evento geológico significativo: a formação de um novo supercontinente, conhecido como “Pangeia Próxima“. Cientistas da Universidade de Bristol estimam que, em cerca de 250 milhões de anos, os continentes que conhecemos se unirão novamente em uma única massa de terra.
Curiosamente existe uma linha invisível no meio do oceano onde NADA atravessa e que define o limite mais intrigante da biogeografia, enquanto ilhas coladas no mapa exibem ecossistemas incompatíveis. ()
“Essa divisão recebe o nome de Linha de Wallace. Ela destaca uma das fronteiras biológicas mais marcantes do planeta. Essa ruptura foi identificada em 1859 por Alfred Russel Wallace, naturalista e coautor da teoria da seleção natural com Charles Darwin. A linha separa a fauna asiática da fauna australásia, mesmo quando as ilhas ficam surpreendentemente próximas.
A Linha de Wallace passa entre Bali e Lombok. Ela também divide Borneo e Sulawesi. Com isso, ela cria uma transição abrupta entre dois grupos faunísticos. A mudança é súbita, mesmo com distâncias extremamente curtas entre as ilhas.
Fauna a oeste da Linha de Wallace (Ásia)
Mamíferos placentários, como tigres, macacos e rinocerontes.
Aves típicas da região, como pica-paus.
Fauna a leste da Linha de Wallace (Australásia)
Marsupiais, como cangurus e cuscuzes.
Aves coloridas, como cacatuas e aves-do-paraíso.
Assim, poucos quilômetros separam dois mundos evolutivos completamente distintos. A força dessa barreira está ligada à geologia da região. A Linha de Wallace coincide com uma trincheira oceânica profunda, posicionada entre duas placas tectônicas. Durante as Eras Glaciais, o nível do mar baixava significativamente. Essa queda permitia que pontes de terra conectassem o continente asiático às ilhas de Bali e Borneo. Essas conexões formavam a antiga Sundalândia. Entretanto, a profundidade da trincheira impediu que a passagem entre outras ilhas emergisse. Isso ocorreu mesmo nos períodos de mar mais baixo. Consequentemente, a água permaneceu como uma barreira permanente. Essa barreira evitou o contato entre as faunas por milhões de anos. Assim, espécies de cada lado evoluíram isoladas. Esse isolamento criou ecossistemas incompatíveis, apesar da proximidade geográfica.”

II – Extinção de Espécies
“Na visão de Charles Darwin, a seleção natural se relaciona com a extinção na competição entre espécies distintas, já que as mais numerosas teriam melhores chances de responder às pressões seletivas por disporem de mais variedades entre sua população, enquanto as espécies menos numerosas teriam menos possibilidade de acompanhar o ritmo das transformações de suas concorrentes.
A extinção em massa se caracteriza pelo decréscimo da biodiversidade através da extinção excepcionalmente alta de vários grupos de seres vivos. Em cerca de 4,5 bilhões de anos de existência, o planeta Terra passou pelo menos por cinco grandes extinções em massa.” ()
A biodiversidade existente hoje no planeta seria apenas de 1% do que já existiu. A história da terra sempre foi marcada por extinções em massa em diferentes períodos geológicos:
439 milhões de anos atrás (Ordoviciano), 60% da biodiversidade extinta, causas: aquecimento global, flutuações drásticas do nível do mar e grandes glaciações;
364 milhões de anos atrás (Devoniano), 50% da biodiversidade extinta, causas: incerta, possível resfriamento global;
251 milhões de anos atrás (Permiano), 85% da biodiversidade extinta, causas: vulcanismo exacerbado e aquecimento global;
200 milhões de anos atrás (Triássico), 50% da biodiversidade extinta, causas: incertas, possível vulcanismo exacerbado e aquecimento global;
65 milhões de anos atrás (Cretáceo), 50% da biodiversidade extinta, causas: possíveis impactos de asteroides; e
Extinção do Holoceno em andamento: supostamente, a taxa de extinção de espécies no presente seria 100 a 1.000 vezes superiores à média evolutiva do planeta Terra. Causas atribuíveis à influência humana e aos desastres naturais. Mas paradoxalmente a cada extinção em massa, sobreveio uma explosão de biodiversidade.
“Aqui está a história de todas as extinções continentais e marinhas da Lista Vermelha para as quais a Lista Vermelha tem uma data para a extinção. Os dados iniciais são escassos e, como resultado, contêm poucas extinções por ano, por isso mostrei o período de 1850 em diante, quando ocorriam muito mais extinções por ano, e para o qual temos dados muito melhores.
… Não houve nenhuma tendência significativa na taxa de extinções ao longo dos últimos 150 anos, quer incluindo apenas as espécies continentais e marinhas, quer incluindo todas as espécies.”
… A média de 1850-2000 é de 3,6 extinções de espécies continentais e marinhas por ano, com um valor máximo de cerca de 8 extinções por ano. A Lista Vermelha contém 157.190 espécies continentais e marinhas, das quais 909 estão extintas.
Portanto, se a taxa de extinções continuar no nível atual, no ano 2100 veremos 3,6 extinções adicionais/ano * 76 anos = 274 extinções.
Todas as extinções de espécies continentais e marinhas, de 1850 a janeiro de 2024. Estas estão agrupadas em categorias de 5 anos. A linha vermelha representa a tendência de 1850 a 2000, e não até o presente, para evitar distorcer a tendência, porque pode levar algumas décadas para que uma extinção seja verificada.
Agora, isso significa que não devemos nos preocupar com extinções?
Absolutamente não. Precisamos de estar conscientes de todos os resultados das nossas ações humanas e, sempre que possível e prático, fazer concessões às criaturas com quem partilhamos o planeta.
No entanto, também precisamos manter o senso de proporção. As extinções fazem parte de como a natureza funciona.
E se uma determinada espécie, após milhões de anos de evolução, existir apenas numa pequena área do planeta, as suas probabilidades de extinção são muito elevadas, não importa o que façamos. É óbvio que não consegue adaptar-se nem mesmo à menor mudança no seu ambiente – se pudesse, seria encontrado numa área muito maior.” ()
E pasme, no inventário da fauna do município de São Paulo (a “Selva de Pedra”) em 2024 estão apresentadas 1.453 espécies distribuídas em 175 áreas verdes e cinco corpos hídricos dentro do município de São Paulo, incluindo Parques Urbanos, Parques Lineares, Unidades de Conservação e outras áreas verdes significativas.
Estão catalogadas 602 espécies de animais invertebrados e 851 espécies de vertebrados. Por grupo são: 41 moluscos, 3 crustáceos, 3 lacraias, 85 aracnídeos, 470 insetos, 57 peixes, 89 anfíbios, 59 répteis, 523 aves e 123 mamíferos.
Em relação à distribuição geográfica, 225 espécies (15,5%) são endêmicas da Mata Atlântica e 146 (10%) são endêmicas do território brasileiro. Considerando o estado de conservação das espécies na natureza, 222 espécies (15,3%) se encontram ameaçadas de extinção, constando em uma ou mais listas de ameaçadas. Cento e treze espécies constam na lista de espécies ameaçadas de extinção do Estado de São Paulo, 29 espécies figuram na lista de espécies ameaçadas de extinção do Brasil, 59 espécies estão ameaçadas de extinção segundo a União Internacional para a Conservação da Natureza e dos Recursos Naturais, e 119 espécies são consideradas ameaçadas pelo tráfico internacional segundo a Convention on International Trade in Endangered Species of Wild Fauna and Flora. ()
“A cultura romântica alemã é o solo nativo a partir do qual o nosso ambientalismo moderno cresceu, e muitos elementos pseudocientíficos do ambientalismo popular que são impensadamente considerados racionais e progressistas são, na verdade, legados de uma tradição romântica apaixonadamente reacionária do século XIX. Uma delas é a ideia duvidosa da teia da vida – nenhuma espécie de planta ou animal pode ser extinta sem prejudicar todas as demais. Isto é um disparate, porque as espécies surgiram e desapareceram durante milhares de milhões de anos, sem necessariamente causarem a extinção de um grande número de outras espécies. Em alguns casos, o desaparecimento de alguns tipos de vida vegetal e animal abriu oportunidades para outros, da mesma forma que a extinção dos dinossauros permitiu que os mamíferos se expandissem para novos nichos.” ()

III – Mudanças Climáticas e Extinção das Espécies
Em 2023, as emissões de gases de efeito estufa (GEE) bateram um novo recorde global, com 57,1 gigatoneladas de CO2 equivalente, um aumento de 1,3% em relação a 2022.
A concentração média global de CO2 atingiu 420 partes por milhão (ppm) em 2023.
Durante o período dos dinossauros, répteis de sangue frio que exigiam climas quentes, consumiam volumes massivos de vegetação e pereciam quando a Terra esfriava, os níveis de CO2 eram de aproximadamente 3.600 ppm, criando as condições jurássicas que permitiram que os dinossauros florescessem, vagando pela Terra por milhões de anos. [] Os maiores dinossauros encontrados até o momento são: Titanossauro herbívoro (Patagotitan mayorum) com 40 metros de comprimento, 8 metros de altura e 77 toneladas e o Saurópode (Argentinosaurus huinculensis) com 35 metros de comprimento e 90 toneladas, ambos encontrados na Argentina. Diversas teorias tentam explicar a extinção dos dinossauros, sendo que a mais aceita atualmente é a que justifica a catástrofe como sendo resultado da colisão de um asteroide com a Terra e não o aumento de temperatura pela concentração de CO2 ou de GEE.
A estimativa da diversidade de espécies varia amplamente, com cerca de 1,5 milhão de espécies descritas, mas estimativas sugerem que o planeta pode ter entre 10 e 50 milhões, ou até 8,7 milhões de espécies conhecidas.
Os pesquisadores da Universidade de Indiana, Jay Lennon e Kenneth Locey, utilizaram grandes conjuntos de dados e leis de escala para estimar que a Terra abriga quase 1 trilhão de espécies, principalmente micróbios, das quais apenas uma pequena fração (cerca de 1/1000 de 1%) foi descrita, evidenciando uma enorme lacuna no conhecimento biológico, particularmente no que diz respeito à vida microscópica. ()
Do ponto de vista científico, a probabilidade de vida na Terra é vista como extremamente baixa, a existência da vida é um fenômeno notável que desafia a intuição estatística, porque a formação espontânea das moléculas complexas necessárias para a vida, como o DNA e as proteínas, é um evento de probabilidade incrivelmente pequena, dadas as condições iniciais do universo.
O universo parece ser “ajustado” para a vida, com constantes físicas precisas. Se qualquer uma dessas constantes fosse ligeiramente diferente, a vida como a conhecemos não existiria. Isso sugere que as condições para a vida são raras. Apesar dessas probabilidades minúsculas teóricas, a realidade é que a vida existe em abundância na Terra.
Segundo o professor Andrew Watson, da Universidade de East Anglia, a vida na terra evoluiu através de quatro “estágios críticos” e que a probabilidade de esses mesmos estágios terem ocorrido em outro planeta é de menos de 0,01%. Os quatro estágios seriam: bactéria de uma única célula, células complexas, células especializadas que permitem formas complexas de vida e vida inteligente com uma linguagem estabelecida.

IV – Alienígenas
A questão de os “seres estelares” (ou starseeds – entidades de outras dimensões ou planetas que escolheram encarnar na Terra com a missão de ajudar na evolução da humanidade ou “curar o planeta”) que supostamente povoaram a terra serem considerados espécies invasoras depende inteiramente da perspectiva adotada: a definição científica de espécie invasora é baseada em critérios biológicos e ecológicos, enquanto a ideia de “seres estelares” provém de crenças espirituais e da ufologia, não da ciência convencional.
Se os próprios “seres estelares” fossem os primeiros povoadores, eles seriam a espécie fundadora ou nativa do ponto de vista de sua própria origem na Terra. Uma espécie só é considerada invasora se desequilibra o ecossistema existente. Sem a existência comprovada e a análise de seu impacto biológico real, é impossível classificá-los cientificamente. Eles não seriam vistos como invasores no sentido predatório, mas como colaboradores ou guias, parte de um plano cósmico ou espiritual, não uma invasão biológica que ameace o ecossistema.
Acredite se quiser…

V – Os Seres Humanos como Espécie Invasora
Muitos ecólogos e cientistas ambientais veem os seres humanos como a “espécie invasora suprema” devido ao seu impacto global e à sua capacidade de alterar ecossistemas de forma drástica. A nossa espécie é a única entre os humanos (hominídeos) que colonizou todo o planeta — todos os continentes e diversas ilhas. Outras espécies humanas como os Homo neanderthalensis e os denisovanos chegaram a ocupar partes da Europa e Ásia, mas somente os Homo sapiens se espalharam globalmente.
Sempre que Homo sapiens chegava a um novo local, vinha junto uma transformação drástica do ambiente: populações humanas arcaicas sofriam extinção, espécies de animais também desapareciam.
Escavações feitas na África do Sul apresentam indícios de que, há cerca de 160 mil anos, grupos de Homo sapiens começaram a depender fortemente de recursos costeiros — por exemplo, mariscos — que eram densos, previsíveis e abundantes.
Esse tipo de recurso permitiu a sobrevivência da espécie durante períodos de mudanças climáticas difíceis, e também favoreceu a formação de territórios fixos que podiam ser defendidos.
A necessidade de proteger esses recursos levou a conflitos entre grupos — e nesses choques, a combinação de cooperação interna + armas eficazes dava vantagem decisiva aos Homo sapiens.
O Homo Sapiens (nós humanos) é a única espécie viva presente em todos os continentes e em todos os tipos de clima: podemos viver em savanas, desertos, florestas, montanhas, tundras, ambientes costeiros, desde os desertos quentes (até 70,7 °C) até as regiões polares (até -71,2 °C).
A capacidade de organização social capaz de cooperação ampla (hipersociabilidade — cooperação profunda com indivíduos fora do próprio grupo familiar), mobilidade e adaptabilidade a diferentes ecossistemas, bem como tecnologias de caça e guerra extremamente eficaz, sendo capaz de dominar praticamente qualquer ecossistema teria feito do Homo sapiens a “espécie invasora definitiva”. Onde chegava, tornava-se um predador dominante — de terra ou mar — e frequentemente provocava extinções: de animais (destaque para a extinção de megafauna em vários continentes), de outras espécies humanas, e transformações profundas nos ecossistemas.
Os extintos neandertais, por exemplo, podem não ter “competido bem” com essa combinação de cooperação + poder bélico — e acabaram sendo exterminados ou absorvidos.
Nossa capacidade de cooperação com desconhecidos + potencial destrutivo quando competimos por recursos ajuda a explicar por que genocídios e a xenofobia continuam a ocorrer — quando grupos humanos veem “os outros” como ameaça por causa de recursos limitados. ()
Os humanos modernos se espalharam e se tornaram a espécie dominante em todos os continentes, adaptando-se a habitats muito diversos. Em muitos casos, os ecossistemas se adaptaram junto com a presença humana ao longo de milênios. Nenhuma outra espécie tem um impacto comparável em escala global.

VI – Domesticação de Animais e Plantas
A evolução humana está intrinsecamente ligada à domesticação de espécies e, mais tarde, à invasão biológica, processos que transformaram profundamente o modo de vida da nossa espécie e o planeta.
A domesticação de plantas e animais, teria iniciada há cerca de 10.000 anos, marcando a transição do estilo de vida de caçador-coletor para comunidades agrícolas sedentárias. Isso permitiu o estabelecimento de assentamentos permanentes, o crescimento populacional e o desenvolvimento das primeiras civilizações.
Ao invés da seleção natural, os humanos passaram a exercer uma forte “seleção artificial”, escolhendo características desejáveis em plantas (maior rendimento de colheita) e animais (mansidão, produção de leite, carne, ou capacidade de trabalho). Isso levou a mudanças genéticas e morfológicas permanentes nas espécies domesticadas, que se adaptaram a ambientes criados pelos humanos.
A maioria dos animais que vivem sob controle humano são domesticados e desempenham papéis importantes em muitos aspectos da vida diária (lista não exaustiva):
Animais de esporte e entretenimento (ex.: cavalos, cães).
Como animais de estimação e companheiros sociais (ex.: cães, gatos, porquinhos-da-índia);
Como animais de laboratório, são importantes para o progresso da pesquisa biomédica (ex.: camundongos, ratos);
Fornecem proteção (ex.: cães); e
Fornecem-nos alimentos (ex.: carne, leite, ovos) e materiais básicos (ex.: sebo, cera, penas).
A proximidade com animais domesticados também expôs os humanos a novos patógenos, o que, ao longo de gerações, gerou novas pressões seletivas e moldou o sistema imunológico humano.
Com a domesticação, os humanos não apenas se fixaram, mas também se expandiram globalmente, levando consigo suas espécies domesticadas. Cavalos, gado, cães, gatos e plantas cultivadas foram introduzidos em novas regiões, muitas vezes deslocando espécies nativas.
Muitas dessas espécies transportadas, intencionalmente ou acidentalmente (como ratos e insetos em navios), tornaram-se espécies exóticas invasoras em novos ecossistemas. A ausência de predadores naturais ou condições ambientais favoráveis permitiu que essas espécies se proliferassem descontroladamente.
A alteração profunda e, muitas vezes, prejudicial dos ecossistemas através da introdução e invasão de espécies domesticadas em escala global, tem contribuído para a degradação da qualidade ambiental, a extinção de fauna e flora nativas, mudanças na dinâmica dos ecossistemas e a homogeneização biótica global.

VI – Criacionismo
A questão de Deus ter criado o mundo com “espécies invasoras” envolve uma intersecção entre definições biológicas modernas e interpretações teológicas da criação. A perspectiva teológica predominante é que Deus criou todas as espécies em harmonia e que o conceito de “espécie invasora”, com seus impactos negativos, é um resultado posterior da ação humana e da desarmonia no mundo.
De acordo com relatos bíblicos (livro de Gênesis), Deus criou todos os seres vivos, “cada um conforme a sua espécie”, e viu que tudo o que havia feito era “bom”. Isso implica que, na criação original, havia um equilíbrio e harmonia inerentes a todas as formas de vida em seus respectivos lugares. O conceito de uma espécie ser prejudicial ou “invasora” em seu ambiente nativo não se alinha com a ideia de uma criação perfeita e “boa” de Deus.
A presença de desarmonia e elementos prejudiciais no mundo, como o sofrimento ou a agressividade predatória (que não eram o plano original), como consequências da Queda (o pecado original) e do afastamento da humanidade do plano divino original. A permissão para o consumo de carne após o Dilúvio (Gênesis 9:3) é vista por alguns como uma concessão temporária devido a um mundo já transformado pela ação humana e pela devastação.
O fenômeno das espécies invasoras, que ameaçam a biodiversidade e os ecossistemas, é entendido como um resultado das ações humanas de deslocamento de espécies e da subsequente desregulação ecológica, e não como parte do design original e perfeito de Deus.

Conclusões

A invasão de ecossistemas consolidados por organismos é um fenômeno natural, mas as introduções facilitadas pelo ser humano aumentaram consideravelmente a taxa, a escala e o alcance geográfico das invasões.
O termo “invasor” é mal definido e frequentemente muito subjetivo. Espécies invasoras podem ser plantas, animais, fungos e micróbios. O fato de algumas introduções serem bem-sucedidas não necessariamente são prejudiciais. O entomologista Chris D. Thomas argumenta que a maioria das espécies introduzidas são neutras ou benéficas em relação a outras espécies ()
Algumas espécies invasoras podem fornecer um habitat adequado ou fonte de alimento para outros organismos. Em áreas onde uma espécie nativa foi extinta ou atingiu um ponto em que não pode ser restaurada, espécies não nativas podem desempenhar seu papel.
Espécies não nativas podem atuar como catalisadores para a restauração, aumentando a heterogeneidade e a biodiversidade em um ecossistema. Isso pode criar microclimas em ecossistemas esparsos e erodidos, promovendo o crescimento e o restabelecimento de espécies nativas. Por exemplo, as goiabeiras em terras agrícolas são atraentes para muitas aves frugívoras, que deixam cair sementes de árvores da floresta tropical a até 2 km de distância sob as goiabeiras, incentivando a regeneração da floresta.
Espécies não nativas podem fornecer serviços ecossistêmicos, funcionando como agentes de biocontrole para limitar os efeitos de pragas agrícolas invasoras.
Espécies exóticas podem se adaptar a novos territórios e contribuir com a economia regional e melhoria da qualidade de vida, como o eucalipto, o pinus, a braquiária, a tilápia e a truta.
Porém, espécies exóticas invasoras podem representar ameaças ao meio ambiente, com enormes impactos e prejuízos sobre a biodiversidade e os ecossistemas naturais, a provisão de serviços ambientais, a saúde, a economia, bem como a conservação do patrimônio genético e natural.
A gestão sobre espécies exóticas invasoras envolve agendas amplas com ações multidisciplinares e interinstitucionais. Ações de prevenção, monitoramento, controle e erradicação são fundamentais e exigem o comprometimento e a convergência de esforços de diferentes entes dos governos federal, estaduais e municipais envolvidos com o tema, além de setores empresariais e organizações não-governamentais.
Os planos de prevenção e controle no Brasil, incluem o monitoramento, manejo e erradicação de espécies exóticas invasoras, instrumentos de gestão previstos na Estratégia Nacional, que deveriam ser construídos de forma participativa e articulada com as diversas esferas de governo e setores da sociedade, com objetivos definidos em escala temporal. Ao focar em determinadas espécies ou grupos de espécies, ou de acordo com o recorte geográfico das ocorrências, com os métodos de prevenção e controle, ou com as vias e vetores de introdução/dispersão, podem envolver a prevenção de espécies que apresentam potencial risco de introdução ou o controle daquelas que já estão presentes, com vistas ao seu manejo até sua erradicação.
O Brasil é signatário do Acordo Global de Biodiversidade Kunming-Montreal (2015) e tem como meta reduzir até 2030, em pelo menos 50%, as taxas de introdução e o estabelecimento de espécies exóticas invasoras conhecidas ou potenciais, e erradicar ou controlar espécies exóticas invasoras, eliminando, minimizando, reduzindo ou mitigando as vias de introdução e seus impactos sobre a biodiversidade e serviços ecossistêmicos, especialmente em áreas sensíveis ou prioritárias, como ilhas, territórios tradicionais e ancestrais, comunidades isoladas e áreas protegidas, mediante a implementação e monitoramento da Estratégia e do Plano de Ação Nacional para Espécies Exóticas Invasoras e da Lista de Pragas Quarentenárias Presentes e Ausentes.
Tente imaginar os prejuízos, custos e caos decorrentes da prevenção, controle e erradicação das espécies exóticas invasoras integrantes da Lista Nacional de Espécies Exóticas Invasoras 2025 (suspensa temporariamente) abaixo:
Exemplos de flora: amendoeira-da-praia, capim-colonião, casuarina, eucalipto, goiabeira, jaqueira, mangueira e pinus.
Exemplos de fauna: abelha africana, cães e gatos domésticos, camarão vannamei, camundongo, javali, pardal, pirarucu (introduzidos), pombo-comum, tilápia, truta e tucunaré (introduzidos).
A definição de espécies exóticas invasoras precisa ser feita a partir de estudos científicos auditáveis, ter o envolvimento de todos os segmentos da sociedade interessados com o tema, levar em conta aspectos socioeconômicos, ter a gestão de riscos como base da implantação de programas governamentais, seja de apoio à produção tecnicamente correta destas espécies, seja para programas de monitoramento e controle, e ser validada em audiências públicas.
Espécies invasoras: Quais não são? Não somos todos? Em relação ao meio ambiente temos a tendência de fazer um “retrato” (estático) decorre da nossa dificuldade inata em processar a complexidade e a escala de tempo dos sistemas naturais.
O comportamento do meio ambiente é, fundamentalmente, dinâmico e rege-se por interações constantes e cíclicas, e não por um estado de equilíbrio permanente.
Os processos mais impactantes da natureza (evolução geológica, mudanças climáticas de longo prazo, ciclos de nutrientes profundos) ocorrem em escalas de tempo muito além da vida humana. Um rio pode levar milênios para esculpir um cânion; em uma vida humana, ele parece permanente.
Nossos cérebros e sociedades tendem a buscar e impor ordem e estabilidade. Definimos “normalidade” com base em observações de curto prazo, o que nos leva a subestimar a variabilidade natural e a capacidade de autorregulação (resiliência) dos sistemas.
A mídia e a ciência muitas vezes focam em eventos extremos (erupções, furacões, inundações), que, embora sejam manifestações da dinâmica natural, podem obscurecer os processos contínuos e graduais que ocorrem diariamente.
O meio ambiente não é um cenário fixo, mas sim um sistema aberto, resiliente e em constante fluxo, impulsionado por:
Elementos como carbono, nitrogênio e água estão em movimento constante entre a atmosfera, a biosfera, a hidrosfera e a litosfera.
Comunidades de plantas e animais mudam e se adaptam continuamente após distúrbios (incêndios, desmatamento, etc.).
O clima global é um sistema caótico e dinâmico, que responde a mudanças na radiação solar, na composição atmosférica e na circulação oceânica.
Reconhecer essa natureza dinâmica é crucial para a conservação e gestão sustentável dos recursos. Em vez de gerir um “retrato”, devemos gerir um “processo”, compreendendo que a mudança é a única constante no mundo natural.
Não nos parece caro leitor que você, ou o seu cachorro ou o seu gato sejam espécies invasoras, capazes de promover um desequilíbrio ambiental irreversível no ecossistema. Com 149,6 milhões de animais de estimação, segundo o censo do Instituto Pet Brasil (IPB) de 2021, o Brasil é o terceiro país em número de animais domésticos. São apenas 40 milhões de brasileiros com idades entre 0 e 14 anos. As várias formas de vida microbiana (vírus, bactérias e fungos) de quase 1 trilhão de espécies, a grande maioria desconhecida, tem potencial muito maior de promover um apocalipse zumbi visível. Basta lembrar os impactos recentes em escala mundial que o betacoronavírus SARS-CoV-2, responsável pela infecção respiratória aguda COVID-19, causou em todo o planeta!
João Guimarães Rosa, escritor brasileiro em sua obra-prima, Grande Sertão: Veredas, imortalizou uma frase dita pelo personagem Riobaldo, refletindo a complexidade da existência, a incerteza do futuro, a luta contra o desconhecido, os desafios de definir o próprio caminho, o processo de aprendizado e enfrentamento das travessias, não na segurança, pois a coragem para se arriscar e a humildade para aprender são essenciais para se viver plenamente: “Viver é muito perigoso”!!!

Enio Fonseca –Engenheiro Florestal, Senior Advisor em questões socioambientais, Especialização em Proteção Florestal pelo NARTC e CONAF-Chile, em Engenharia Ambiental pelo IETEC-MG, em Liderança em Gestão pela FDC, em Educação Ambiental pela UNB, MBA em Gestão de Florestas pelo IBAPE, em Gestão Empresarial pela FGV, Conselheiro do Fórum de Meio Ambiente do Setor Elétrico, FMASE, foi Superintendente do IBAMA em MG, Superintendente de Gestão Ambiental do Grupo Cemig, Chefe do Departamento de Fiscalização e Controle Florestal do IEF, Conselheiro no Conselho de Política Ambiental do Estado de MG, Ex Presidente FMASE, founder da PACK OF WOLVES Assessoria Ambiental, foi Gestor Sustentabilidade Associação Mineradores de Ferro do Brasil e atual Diretor Meio Ambiente e Relações Institucionais da SAM Metais. Membro do Ibrades, Abdem, Adimin, Alagro, Sucesu, CEMA e CEP&G/ FIEMG e articulista do Canal direitoambiental.com.

LinkedIn Enio Fonseca 

Decio Michellis Jr. – Licenciado em Eletrotécnica, com MBA em Gestão Estratégica Socioambiental em Infraestrutura, extensão em Gestão de Recursos de Defesa e extensão em Direito da Energia Elétrica, é Coordenador do Comitê de Inovação e Competitividade da Associação Brasileira de Companhias de Energia Elétrica – ABCE, assessor técnico do Fórum do Meio Ambiente do Setor Elétrico - FMASE e especialista na gestão de riscos em projetos de financiamento na modalidade Project Finance. https://www.linkedin.com/in/decio-michellis-jr-865619116/Decio Michellis Jr. – Licenciado em Eletrotécnica, com MBA em Gestão Estratégica Socioambiental em Infraestrutura, extensão em Gestão de Recursos de Defesa e extensão em Direito da Energia Elétrica, é Coordenador do Comitê de Inovação e Competitividade da Associação Brasileira de Companhias de Energia Elétrica – ABCE, assessor técnico do Fórum do Meio Ambiente do Setor Elétrico – FMASE e especialista na gestão de riscos em projetos de financiamento na modalidade Project Finance.

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Autor de 27 e-books e coautor de 25 e-books. As 25 publicações mais relevantes estão disponíveis para download gratuito em Independent academia

 

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