Editorial Zero Hora – 17/11/2013
A mobilidade urbana é uma das questões cada vez mais recrutadas por especialistas em gestão de cidades para medir o grau de civilidade das metrópoles.
As conclusões são constrangedoras: as capitais já não detêm a exclusividade da degradação do trânsito, com transporte coletivo precário, superlotação de veículos particulares e desrespeito a regras básicas de convivência com pedestres e ciclistas.
O Brasil pouco fez nessa área nas últimas décadas e mesmo depois das manifestações de junho, motivadas em boa parte pela crise do transporte público, os governos continuam a dever respostas concretas à população.
Somos todos vítimas de engarrafamentos de carros, de ideias superadas e da inércia, num país incapaz de enfrentar os transtornos causados pela duplicação da sua frota de veículos em apenas uma década.
Estudo recente do Instituto de Pesquisa Aplicada, nas principais metrópoles, contribui para o dimensionamento desse drama.
Os moradores de capitais gastam, em média, 30 minutos por dia para chegar ao trabalho. É até um número baixo se confrontado com os de regiões em que milhares de pessoas passam mais de duas horas dentro dos ônibus. Circulam por ruas entupidas por novos veículos, enquanto as soluções viárias não são executadas.
O estudo mostra que entre 2008 e 2012 a proporção de domicílios com algum tipo de veículo privado saltou oito pontos no país e chegou a 54%. É impossível acolher essa frota em cidades sem metrô e com transporte coletivo deficiente.
As cidades não andam, e os efeitos mais visíveis são o aumento de custos, a irracionalidade do transporte individual e a potencialização do estresse, da poluição e dos acidentes.
Metrópoles e algumas médias cidades chegaram ao esgotamento, com prejuízos sempre maiores para as populações mais pobres. Soluções somente darão sentido ao direito de ir e vir se reduzirem, no trânsito, as diferenças econômicas e sociais entre as pessoas.
Essa seria, na definição do ex-prefeito de Bogotá Enrique Peñalosa, a situação em que a mobilidade urbana se apresenta como verdadeira expressão da democracia, da liberdade e da equidade.
É do político colombiano esta frase: “Quando um ônibus passa ao lado de carros engarrafados, temos um símbolo de democracia. O interesse coletivo está acima do particular”.
O Brasil não pode continuar adiando a implementação de soluções conhecidas, que passam pela construção de metrôs, pela melhoria do transporte por ônibus, pelas ciclovias e, inevitavelmente, pelo desestímulo ao uso de automóveis que transportam apenas uma pessoa.
Não se trata de conspirar contra o sonho de todos de almejar o carro próprio, mas de fazer o uso racional dos meios de transporte. Sair do engarrafamento é uma missão do setor público, mas com a colaboração da sociedade.
Foto: Luis Cleber/ AE